Doca Street: O que aconteceu com o assassino de Ângela Diniz?
Marjorie Estiano diz que Ângela Diniz desafia estereótipos de mulheres no cinema
Intérprete da socialite Ângela Diniz, morta pelo namorado Doca Street, na série ‘Ângela Diniz: Assassinada e Condenada’, atriz fala sobre desafios e cuidados. Crédito: TV Estadão
Com a história do caso do assassinato de Ângela Diniz de volta aos holofotes graças à minissérie Ângela Diniz: Assassinada e Condenada, da HBO Max, o nome de Raul “Doca” Street, assassino da socialite, também ganhou novo destaque. O criminoso, que matou a então namorada a tiros em 1976, teve um dos julgamentos mais midiáticos do Brasil à época e sua condenação inicial gerou revolta em movimentos progressistas.
Nascido Raul Fernando do Amaral Street, Doca era empresário e conheceu Ângela meses antes do crime. Então casado e com filhos, ele deixou a família para se relacionar com a socialite e o casal passou a morar junto em Búzios, no Rio de Janeiro.
Juntos por três meses, Doca e Ângela tinham histórico de discussões e brigas acaloradas, que tiveram seu estopim no Réveillon de 1976, quando o empresário desferiu quatro tiros à queima roupa na namorada após ela tentar terminar o relacionamento. Ele passou semanas foragido, sendo preso em janeiro de 1977.

Emilio Dantas como Doca Street em julgamento pelo assassinato de Ângela Diniz, na série ‘Ângela Diniz: Assassinada e Condenada’ Foto: Carlos Eboli/HBO
Julgamento de Doca Street ‘incrimina’ Ângela Diniz
A figura midiática e, até então, polêmica de Diniz fez com que a prisão de Doca, assim como a investigação e o eventual julgamento, tivesse amplo destaque em grandes veículos nos meses seguintes. Dominada por um olhar machista, a grande mídia dava destaque à vida e aos relacionamentos da socialite, incluindo o polêmico caso com o empresário Tuca Mendes, que resultou na morte do caseiro José Avelino.
O julgamento de Street só foi acontecer em 1979, dois anos após a prisão do empresário. Seu advogado, Evandro Lins e Silva, usou como argumento para inocentar seu cliente a chamada “legítima defesa da honra”, então válida de acordo com o Código Penal de 1940. Ao júri, a defesa de Doca tentou manchar a imagem de Diniz, caracterizando-a como uma mulher provocadora, manipuladora, adúltera e viciada em drogas e álcool.
Majoritariamente masculino, o júri aceitou a tese e Street acabou condenado a dois anos de prisão com sursis, medida que dispensou a necessidade do assassino cumprir a pena em regime fechado. Liberado, Doca foi ovacionado na saída do tribunal, enquanto a imagem pública de Diniz sofria novos ataques.
Ainda em 1979, movimentos feministas no País, revoltados com a decisão do tribunal, adotaram o lema “quem ama não mata”, usando o destaque recebido pelo caso de Ângela Diniz para tentar provocar mudanças legais que de fato punissem casos de feminicídio.
A pressão popular, que incluiu protestos nas ruas, levou à reabertura do processo contra Street e, à pedido da Promotoria, ele voltou ao banco dos réus em 1981. Desta vez, o empresário foi condenado a 15 anos de reclusão, mas cumpriu apenas três em regime fechado, transacionando para o regime semiaberto e, eventualmente, aberto, em 1987.

Raul Fernando Street, o Doca Street, pegou 15 anos de cadeia depois de ser acusado de assassinar a socialite e então namorada Ângela Diniz. Em 1975, foi inocentado sob o argumento da “defesa da honra” Foto: Reprodução
Em 2006, Doca publicou o livro Mea Culpa, em que dava sua versão da noite do assassinato. De acordo com seu relato, Diniz teria tentado terminar o relacionamento, dizendo que só ficaria com Street caso ele aceitasse dividi-la com outros parceiros sexuais. Após ser agredido com uma maleta em meio à discussão, ele encontrou o revólver e disparou contra a namorada.
No mesmo ano da publicação do livro, Street deu entrevistas dizendo ter merecido sua segunda condenação, relatando ainda que sentia vergonha da absolvição inicial e da atenção positiva que recebia do público após o julgamento de 1979.
Após deixar a prisão, Doca viveu de forma discreta até morrer em 2020, aos 86 anos, vítima de uma parada cardíaca.
Em 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) se reuniu para discutir a tese da “legítima defesa da honra”, usada pela defesa de Doca no primeiro julgamento. Entendendo que o argumento feria princípios constitucionais como igualdade de gênero, dignidade humana e proteção à própria vida, proibiu seu uso.
O caso Ângela Diniz na cultura
Ângela Diniz: Assassinada e Condenada não é a primeira produção a abordar o assassinato da socialite. Já em 1982, a Rede Globo transmitiu a minissérie Quem Ama Não Mata, estrelada por Marília Pêra e Cláudio Marzo. Artistas como Titãs e Aluisio Machado chegaram também a incluir o nome de Doca Street em suas músicas.
Em 2020, o podcast Praia dos Ossos, que recontava o caso, se tornou grande sucesso nacional, reabrindo o debate sobre a impunidade de crimes como o de Doca e a vilanização de mulheres que não se encaixam em padrões de comportamento patriarcais, especialmente diante da maior abertura a discussões de feminicídio e violência de gênero que aconteceu no século 21.
Em 2023, o filme Ângela chegou aos cinemas, com Ísis Valverde no papel de Diniz e Gabriel Braga Nunes no papel de Doca. O longa, no entanto, foi criticado por seu retrato raso de Ângela e a equivocada mistura de feminicídio e erotismo.
Baseado em Praia dos Ossos, Ângela Diniz: Assassinada e Condenada traz Marjorie Estiano como Diniz e Emílio Dantas. A minissérie estreou nesta quinta-feira, 13, na HBO Max, que disponibilizará novos episódios semanalmente até 11 de dezembro.



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