entenda característica estranha detectada em cometa interestelar 3I/Atlas que provocou teorias alienígenas
O objeto astronômico que mais causou furor em 2025, o 3I/Atlas, terá sua aproximação máxima da Terra nesta sexta-feira, dia 19, e em seguida começa a ir embora do Sistema Solar, para sempre. Nesta última semana da visita, astrônomos se organizam para observá-lo e tentar descobrir algo mais sobre sua origem. O rumor que mais fez o 3I/Atlas atrair atenção do público porém, já se provou equivocado: ele não é uma espaçonave alienígena, e sim um cometa.
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Quando esse objeto foi detectado, em julho, o pouco que se sabia dele é que tinha origem interestelar. Em outras palavras, por sua trajetória, era possível saber que não estava orbitando o Sol, e tinha se originado em um outro sistema estelar, não no Sistema Solar.
Astrônomos fizeram então uma primeira análise por espectrometria (decomposição da luz) e observaram que o 3I/Atlas tinha uma composição metálica um pouco diferente da de um cometa comum. Isso gerou especulação de que se tratava de um artefato tecnológico, mas à medida que ele se aproximava, ficava mais claro que era mesmo um cometa, ainda que não totalmente comum.
— No geral, ele é mais semelhante do que diferente — afirma Cyrielle Opitom, astrônoma da Universidade de Edinburgo, envolvida em vários estudos sobre o 3I/Atlas. — Ele se comporta de maneira muito parecida com um cometa do nosso próprio Sistema Solar, com sua dispersão de gases, sua atmosfera ao redor e sua cauda. O que há é uma pequena diferença em sua composição.
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O visitante interestelar, apontam observações preliminares, é muito rico em dióxido de carbono, algo visto em poucos cometas conhecidos, além de ter uma proporção diferente de ferro e níquel (com pequeno excesso deste segundo metal).
Essa anomalia não chega a ser totalmente inédita no Sistema Solar, mas foi o suficiente para o astrofísico Abraham Loeb, da Universidade Harvard, ter lançado ele próprio em julho a hipótese sobre o objeto em questão ter origem tecnológica extraterrestre.
No estudo mais recente do cientista, porém, ele aparenta já não se preocupar com essa possibilidade. O trabalho é dedicado a entender o processo de formação da cauda do objeto, já tratado cometa. A palavra “alien” não é reutilizada na pesquisa.
Especulações à parte, o 3I/Atlas tinha mesmo uma característica estranha quando chegou ao Sistema Solar. Quando foi detectado em julho, perto da órbita de Júpiter, sua cauda estava apontando mais ou menos na direção do Sol. Isso é atípico para um cometa comum, que normalmente tem a cauda apontando para o outo lado.
A cauda se forma quando o vento solar (partículas eletricamente carregadas emanadas pelo Sol) ‘sopra’ os gases da atmosfera do cometa na direção oposta. Por isso só ficou claro que o 3I/Atlas era mesmo um cometa quando ele se aproximou mais do Sol e uma cauda convencional se formou.
Loeb e outros cientistas acreditam que a “anti-cauda” do cometa interestelar apareceu quando ele estava muito distante ainda, e só sua face mais próxima do Sol estava quente o suficiente para sublimar. Com esse material descolando do cometa só em seu lado iluminado, ele começa a ser ejetado na forma de grãos de gelo ainda grandes demais para serem arrastadas pelo vento solar. Só quando a radiação solar derreteu esses “floquinhos de neve” cometários é que a cauda convencional do cometa teria começado a se formar.
Os trabalhos mais recentes sobre 3I/Atlas, incluindo os de Loeb e os de Opitom, estão todos sendo divulgados como “pré-prints”, estudos ainda sem revisão independente, porque cientistas querem interagir logo enquanto o objeto ainda está no Sistema Solar. Uma vez que essas análises passem pela peneira da revisão, será mais fácil saber quais têm chances melhores de estarem corretos.
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As observações mais precisas sobre o 3I/Atlas, porém, não estão ainda descritas nos estudos.
— O cometa está chegando mais perto da gente, mas também está se afastando do Sol, o que o deixa menos ativo — diz Opitom. — Por isso acredito que as melhores observações serão feitas antes da sexta-feira, ou talvez até já tenham sido feitas.
A cientista está envolvida tanto na análise de imagens do Telescópio Espacial James Webb, da Nasa, quanto nas do Very Large Telescope (VLT), o maior do mundo, construído pelo Observatório Europeu do Sul (ESO) no Chile.
— Essa é uma oportunidade única para estudar de muito perto um pedaço de material formado em torno de outra estrela — diz Opitom. — Os outros métodos para fazer isso dependem de observar coisas muito, muito distantes, e são mesmo difíceis.
Não foi com esses supertelescópios, porém, que o 3I/Atlas foi encontrado. Quem o achou foi o projeto Asteroid Terrestrial-impact Last Alert System (Atlas), também da Nasa, que tem um telescópio menor no Chile dedicado a varrer o céu e achar astros em risco de colisão com a Terra. Não é o caso do 3I/Atlas, que passará a 270 milhões de quilômetros de nós e se afastará para sempre.
Sondas espaciais da Nasa na órbita de Marte já fizeram imagens quando o 3I/Atlas passou perto do planeta vermelho, e existe uma esperança remota de que a sonda Juno, na órbita de Júpiter, possa capturar alguma coisa também.
A despedida desse cometa deixa um certo clima de melancolia entre amantes da astronomia, porque ele foi apenas o terceiro objeto de origem interestelar já identificado. Os outros dois foram Oumuamua, um rochedo alongado de cerca de 300 metros descoberto em 2017, e Borisov, um cometa interestelar bastante parecido com um cometa solar, encontrado em 2018.
Especialistas acreditam que existe uma boa perspectiva de achar mais desse tipo de visitante no futuro, porém. O Observatório Vera Rubin, no Chile, que abriga o projeto Legacy Survey of Space and Time (LSST), possui o telescópio com a maior câmera digital do mundo dedicado a fazer uma varredura do céu pelos próximos anos.
Com participação do Brasil, a empreitada é agora a melhor aposta para encontrar esses pedaços de material vindos de outros cantos da galáxia.
— A expectativa é que esse grande levantamento descubra de um a cinco objetos interestelares por ano — diz o astrônomo brasileiro Felipe Ribas, professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).
Um bom sinal é que o próprio 3I/Atlas foi encontrado posteriormente nas primeiras imagens do LSST, datadas de quando o telescópio estava ainda sendo comissionado e testado no meio do ano. Ribas participa da equipe que está analisando essa observações.
Segundo o cientista, a medida que mais objetos interestelares sejam achados, teremos uma ideia melhor sobre se as coisas que enxergamos em volta do nosso Sol são parecidas com aquelas geradas em outras estrelas.
Quem se frustrou com este cometa não ser uma espaçonave ET, pode se entusiasmar com a constatação de que, talvez, o lugar de onde ele veio tenha um planeta parecido com a Terra. O fato de 3I/Atlas ser um cometa meio diferentão é revelador nesse sentido.
— Isso nos diz que, no ambiente em que esse cometa se formou, existe uma composição de elementos e matéria diferente da do Sistema Solar — afirma Ribas. — Sabemos agora que o 3I/Atlas veio de um sistema estelar que é diferente do nosso mas, mesmo assim, formou um cometa parecido com os nossos.



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