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Entre ceias de Natal perdidas e cuidados médicos afetados, SP chega ao 4º dia sem luz com ação na Justiça e Enel acuada

Entre ceias de Natal perdidas e cuidados médicos afetados, SP chega ao 4º dia sem luz com ação na Justiça e Enel acuada

Para quem está há três dias sem luz, a falta de energia não é apenas um transtorno. Moradores de São Paulo relatam prejuízos com alimentos perdidos, incluindo ceias de Natal inteiras, e problemas para manter cuidados médicos que dependem do abastecimento. Na sexta-feira, o Ministério Público paulista e a Defensoria Pública do estado acionaram a Justiça para exigir que a Enel, concessionária responsável pelo serviço na maior parte da Região Metropolitana, normalize o fornecimento “imediatamente”, sob pena de multa de R$ 200 mil por hora.

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Até as 20h dessa sexta, ainda havia cerca de 640 mil imóveis sem luz. O apagão teve início na manhã da última quarta-feira, em meio a um vendaval histórico — ou seja, há milhares de clientes completando neste sábado três dias com o serviço cortado. A Enel afirma que “o evento climático causou danos severos à infraestrutura elétrica” e, até o momento, não forneceu prazos para estabilização de cenário.

No auge do problema, 2,2 milhões de endereços ficaram sem luz, o equivalente a 25% do total de ligações ativas. Houve efeito cascata no trânsito, no abastecimento de água e na malha aérea, com centenas de voos cancelados e caos em aeroportos pelo país — em um panorama que só abrandou ao longo da sexta.

Mas fortes chuvas que atingiram a capital na tarde de sexta agravaram o quadro novamente, com imóveis que haviam tido a energia religada voltando a registrar quedas. O ciclone extratropical que causou as fortes rajadas no meio da semana já se afastou, mas uma outra frente de instabilidade traz risco de novos temporais ao longo deste fim de semana.

Na ação civil pública protocolada sexta, o promotor Denilson de Souza Freitas pede que a Enel retome o fornecimento para todas as unidades afetadas desde o dia 9 de dezembro ou, no máximo, em até quatro horas após a ciência da decisão judicial. Além da religação urgente, demanda-se que a empresa seja obrigada a fornecer estimativas claras e precisas sobre o retorno do serviço. Caso a concessionária descumpra a determinação, o MPSP solicita a fixação de uma multa horária de R$ 200 mil.

Em outra frente de pressões sobre a concessionária, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) acusou a Enel de mentir sobre o número de carros nas ruas na operação de contingência. Segundo Nunes, a alegação da Enel de que haveria 1.500 equipes em campo não condiz com a realidade monitorada pelo sistema SmartSampa.

— Posso afirmar categoricamente que isso não é verdade — disse o prefeito, citando um rastreamento das placas de veículos da concessionária com as câmeras espalhadas pela cidade, que teria indicado que, na quinta-feira, menos de 40 veículos da empresa estariam circulando pela capital.

Diante da reincidência de apagões — também houve episódios críticos em 2023 e 2024 —, Nunes fez coro com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e defendeu uma intervenção na Enel, bem como o início do processo de caducidade do contrato:

— Chegou o momento de dar um basta e virar essa página. Precisamos conversar com o governo federal que extrapolamos o limite.

Questionado sobre uma possível intervenção na concessionária, o vice-presidente, Geraldo Alckmin, disse que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), responsável pela regulação e fiscalização do setor, tem o dever de agir “de maneira rigorosa”. Ele comentou o caso após participar de um seminário na capital paulista na sexta-feira.

— Esse é o papel da agência, de regulador e fiscalizador. Espero que isso seja cumprido com rigor — pontuou.

Enquanto uma solução não chega, moradores amargam prejuízos. O advogado Venâncio Pereira, que mora no bairro da Saúde, na Zona Sul, pagou R$ 400 no início da semana pela preparação de um conjunto de marmitas para a família ao longo do mês. Tudo estava acondicionado no congelador, mas não deve sobreviver às dezenas de horas com o equipamento desligado.

— Tenho ainda peru, carnes e linguiça pro Natal — contou.

Nas redes, os relatos se espalham, e usuários paulistanos mostram a lista de alimentos jogados no lixo após estragarem pela falta de refrigeração. Em um deles, exibindo um peru de Natal, uma mulher diz ter vontade de chorar ao ver o desperdício de comida. “Obrigada, Enel”, escreveu.

Já Maria Sofia Araújo Freiria, de 12 anos, precisou descer 14 andares de escada, na quinta-feira, para chegar ao Hospital das Clínicas. Paciente renal, a menina está na fila do transplante e não pode ficar mais de 24 horas sem a diálise. A corrida até o HC foi acompanhada pela mãe, Daylyana Araújo, de 42 anos, que tentava contato com a Enel para ressaltar a necessidade de que a energia fosse religada no imóvel da família, na Mooca. Habitualmente, Sofia consegue fazer o tratamento em casa, dormindo, com a máquina custeada pelo plano conectada à tomada.

— De noite, ela orava e dizia: “Senhor, sei que têm muitas pessoas precisando. Mas só me mande a luz que não peço mais nada” — lembrou Daylyana. — Nós passamos 50 dias internadas entre agosto e outubro. Conseguimos o equipamento com o HC, via convênio, e viemos para casa para ter melhor qualidade de vida

O produtor de eventos Luiz Felipe Lima, por sua vez, é o principal cuidador dos pais idosos e também viveu momentos de desespero. Aos 85 anos, a mãe dele sofreu dois AVCs e está acamada há dois anos, sob cuidados do filho — nos últimos dias, no escuro. Para piorar, a cama elétrica travou numa posição em que dificulta a alimentação da idosa.

— São três dias sem luz, e a gente liga para a Enel e só consegue conversar com um robô maldito, que sequer no encaminha para um atendente — desabafou ao portal g1. (Colaboraram João Sorima Neto e Rafael Garcia)

Caio Rocha

Sou Caio Rocha, redator especializado em Tecnologia da Informação, com formação em Ciência da Computação. Escrevo sobre inovação, segurança digital, software e tendências do setor. Minha missão é traduzir o universo tech em uma linguagem acessível, ajudando pessoas e empresas a entenderem e aproveitarem o poder da tecnologia no dia a dia.

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